acessibilidade do site.

 25/03/2025   09:30   

Compartilhe: 

TJMT Inclusivo promove reflexões sobre inclusão real de pessoas com autismo

Com aplausos entusiasmados, a palestra “Lugar de Autista é em Todo Lugar”, conduzida por Nicolas Brito Sales, foi um dos pontos altos do evento “TJMT Inclusivo: Capacitação e Conscientização em Autismo”, na tarde desta segunda-feira (24 de março), em Sinop (500km de Cuiabá). Autista, artista plástico, fotógrafo premiado e escritor, Nicolas compartilhou sua trajetória, provando que quando se abrem portas, o autismo deixa de ser uma barreira.

Ele reforçou que pessoas neurodivergentes não apenas podem, mas devem estar em todos os lugares. Abordou também os mitos mais comuns sobre o autismo, como a ideia equivocada de que autistas não são criativos ou não conseguem manter um emprego. Com exemplos do próprio cotidiano, ele desconstruiu essas crenças e ressaltou que o acolhimento começa na família, passa pela escola e se consolida com oportunidades reais de desenvolvimento profissional e social. Apontou ainda a urgência de combater o capacitismo e promover a representatividade de pessoas neurodivergentes, não apenas como presença simbólica, mas como protagonistas nos mais diversos espaços da sociedade.

“Foi muito importante para mim mostrar às pessoas que o autista tem espaço no mercado de trabalho e é importante receber não só as pessoas com autismo, mas qualquer outra comunidade neurodivergente”, disse.

Outro destaque foi a palestra “Inclusão Social e Neurodiversidade”, ministrada pela mãe do Nicolas, a neurocientista Anita Brito. Com uma abordagem envolvente e repleta de exemplos práticos, a especialista levou esclarecimentos ao apresentar estratégias que promovem a verdadeira inclusão de pessoas com TEA na sociedade.

Pós-doutora em Neurobiologia dos Transtornos do Neurodesenvolvimento, Anita compartilhou sua experiência de vida — desde a mudança de carreira motivada pelo diagnóstico do filho até a atuação como referência internacional no tema. Ela explicou que o TEA não é uma doença, mas um transtorno do neurodesenvolvimento, o que exige apoio individualizado, uso de tecnologia assistiva, adaptações curriculares e estímulo ao protagonismo de pessoas neurodivergentes. “A neurodivergência não é doença, mas precisa de determinados cuidados, de suporte, e uma pessoa neurodivergente, sendo incluída na sociedade, consegue de fato chegar onde ela quiser”, apontou. “E o Judiciário tem feito um movimento importante, vindo ao encontro de boas práticas, julgando caso a caso e não ao duro ferro da lei que, claro, precisa ser cumprida, mas é preciso analisar particularidades”, complementou.

Falando em tecnologia assistiva, esse tema foi abordado na roda de conversa “O uso da tecnologia assistiva em crianças com Transtorno do Espectro Autista”. O psicopedagogo Everton Ranyery e a fonoaudióloga Isabela Horita trouxeram uma abordagem prática e transformadora sobre como a tecnologia pode romper barreiras na comunicação, aprendizagem e autonomia de crianças autistas. Apresentando conceitos como a Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA), os profissionais explicaram que, para muitas crianças não verbais ou com fala limitada, pranchas de símbolos, aplicativos, vocalizadores e tablets representam muito mais do que ferramentas. “Não se trata de produto. Estamos falando de conquista de autonomia desses pacientes. A comunicação transforma vidas”, declarou Isabela. “Estamos dando voz a esses indivíduos”, acrescentou Everton.

Com exemplos de baixa e alta tecnologia, os palestrantes destacaram que é possível adaptar recursos de acordo com a realidade de cada criança, potencializando habilidades e promovendo a inclusão em diferentes ambientes, da escola à vida social. Segundo eles, é preciso valorizar todas as formas de comunicação, defendendo que antes de ensinar qualquer conteúdo, é preciso garantir que a criança consiga expressar desejos, sentimentos e necessidades. A tecnologia assistiva, nesse contexto, torna-se um direito e uma poderosa aliada na construção de uma sociedade mais acessível, empática e preparada para acolher todas as formas de ser.

A juíza diretora da Comarca de Sinop, Melissa de Lima Araújo, também participou desse debate. A magistrada, que atua na Vara da Infância e da Juventude, ressaltou que, embora analise vários processos ligados ao TEA, ainda há poucos que solicitam a tecnologia assistiva, a fim de garantir inclusão e qualidade de vida às pessoas com autismo, conforme previsto na Lei n°3146/2015. “Além dos momentos de terapia, é importante que os pacientes com TEA tenham esses equipamentos em casa para seguir com o tratamento e a comunicação, acompanhando os progressos em todos os momentos da vida”, disse. “Momentos como esse proporcionam que as pessoas saibam que há uma lei que garante esse direito”.

Também compuseram a mesa a defensora pública Luciana Barbosa Garcia, o promotor de Justiça Milton Cesar Padovan e o presidente da subseção da OAB-MT em Sinop, Fernando Henrique Horita. “Muitas pessoas não sabem dos direitos que as pessoas com autismo possuem. Acesso à Justiça e eventos como esse promovido pelo Judiciário mostram caminhos. É a soma de todos os lados”, apontou Horita, que tem um filho diagnosticado com TEA.

Para os operadores do Direito, conhecimentos como os repassados e compartilhados no evento são importantes porque contribuem diretamente para uma atuação mais sensível, fundamentada e justa nos processos que envolvem pessoas com TEA. “É extremamente importante a gente ter conhecimento. Estima-se que uma a cada 36 pessoas, hoje, seja diagnosticada com o TEA. Outro cenário é a quantidade de pessoas que usam os recursos judiciais e extrajudiciais para assegurar direitos vem aumentando. É importante termos esse conhecimento aprofundado, de forma técnica e científica, mas também humanizado, para que a gente exerça nossas funções da maneira mais adequada e assertiva possível”, declarou Padovan.

A partir da compreensão das especificidades do autismo e das ferramentas de apoio disponíveis, como a tecnologia assistiva, esses profissionais ampliam a capacidade de garantir direitos, promover acessibilidade e evitar decisões baseadas em estigmas ou desinformação. Além disso, o diálogo interinstitucional promovido durante o evento fortalece a rede de proteção e acolhimento das pessoas com deficiência, incentivando práticas colaborativas entre Judiciário, Ministério Público, Defensoria e Ordem dos Advogados. “Dos nossos atendimentos em Sinop ligados à saúde, metade trata do TEA. Por isso, é tão importante bebermos dessa fonte de conhecimento de tantos profissionais renomados para garantirmos uma fundamentação apropriada nos pedidos e garantir esses direitos”, apontou Luciana.

Essa união de esforços foi sentida pelo público presente. “Abriu muito a mente da gente sobre várias coisas, e principalmente, sobre nossos direitos. A gente sente que não está sozinho, que o Poder Judiciário está do nosso lado”, apontou a artesã Jéssika Gomes de Mello, 25 anos, acompanhada do filho Moisés, de 6 anos, diagnosticado com TEA, e da mãe e do padrasto, Alcilene Gomes de Paiva Guerra e Dirceu Arnaldo Guedes, 45 e 62 anos, respectivamente, e que também tem o filho Paulo, de 11 anos, com TEA. “Desde o poema, de manhã, a gente se emocionou demais. Foi tudo muito, muito bom. O que eu aprendi aqui hoje me deu outra visão sobre como devo agir com meu filho”, revelou Dirceu, entusiasmado.

Diagnóstico tardio no Brasil – Ainda na programação, a médica pediatra Anna Letícia Yanai e a psicóloga Tatiany Chocair trouxeram à tona a importância da detecção precoce no prognóstico de crianças com TEA. A palestra “Análise do Desenvolvimento Infantil nas consultas pediátricas: quando suspeitar do TEA” destacou que, embora o diagnóstico seja possível por volta dos 18 meses, ele ainda acontece de forma tardia no Brasil. Com base em estudos recentes e diretrizes do Ministério da Saúde, as palestrantes reforçaram a importância das consultas pediátricas regulares, da avaliação formal do desenvolvimento neuropsicomotor e do uso de instrumentos como o M-CHAT-R/F para rastrear sinais precoces do TEA.

Além da base científica, o debate promoveu uma reflexão sobre a necessidade de uma atuação interdisciplinar entre profissionais da saúde, educação e o sistema judiciário. Isso porque, segundo elas, quando o diagnóstico e a intervenção acontecem precocemente, as chances de evolução positiva aumentam significativamente, favorecendo o desenvolvimento da comunicação, da autonomia e das habilidades sociais da criança. “Quanto menor a criança, mais rápido ela se desenvolve por conta da neuroplasticidade”, disse Anna. As palestrantes ainda ressaltaram o papel estratégico do Judiciário na garantia dos direitos das pessoas com TEA e a importância da formação contínua de magistrados para decisões mais embasadas e humanas. “Não falamos mais de intervenção precoce e sim de intervenção imediata, inclusive com respaldo legal para isso. Temos instrumentos poderosos”, revelou Tatiany.

Vinícius Reis, de 32 anos, foi diagnosticado há dois anos com TEA, mas percebe que, desde então, a busca por terapias especializadas auxiliou no reconhecimento dos gatilhos e na busca pela autorregulação. O evento, segundo ele, contribuiu no acesso às informações atualizadas sobre direitos das pessoas com autismo. “É muito importante para as pessoas se informarem melhor, até para conseguir um laudo, seja lá qual for, e seguir o melhor caminho. No meu caso, agora que tenho o laudo, estou no processo de identificar e buscar esses direitos”, enalteceu.

TJMT Inclusivo - Idealizada pela Comissão de Acessibilidade e Inclusão do TJMT, presidida pela desembargadora Nilza Maria Pôssas de Carvalho — que também é vice-presidente do TJMT — a ação reuniu cerca de 1,1 mil pessoas no auditório da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) e de maneira virtual, por meio da transmissão do evento no canal do TJMT no Youtube (@eventostjmt). Confira a íntegra da programação em Sinop. Profissionais da saúde e da educação, operadores do Direito, mães, pais, cuidadores, pessoas autistas e representantes da sociedade civil uniram forças para discutir caminhos mais empáticos e inclusivos.

A ação, realizada em parceria com a Escola Superior da Magistratura (Esmagis-MT) e a Escola dos Servidores do Poder Judiciário de Mato Grosso, faz parte de uma série de iniciativas promovidas pelo TJMT, alinhadas à Resolução n° 401/2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que orienta sobre políticas de acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência no âmbito do Judiciário.

Depois da realização em Sinop, o projeto TJMT Inclusivo estará em Sorriso (397 km de Cuiabá), nesta terça-feira (25 de março). Mais uma edição está prevista, dessa vez na Capital, no dia 4 de abril, em parceria com a Prefeitura de Cuiabá.

Leia também:

Compreensão do TEA nas áreas médica e da educação é abordada em TJMT Inclusão, em Sinop

Tribunal de Justiça de Mato Grosso amplia ações de inclusão com evento sobre autismo em Sinop

Talita Ormond / Foto: Alair Ribeiro

Coordenadoria de Comunicação do TJMT

imprensa@tjmt.jus.br

Notícias Relacionadas

 05/03/2025   16:14

Poder Judiciário reforça parceria para promover ações de inclusão sobre autismo

 Continuar lendo

 18/03/2025   11:45

TJMT Inclusivo: Judiciário promove evento de conscientização sobre demandas de pessoas com autismo

 Continuar lendo

 26/03/2025   09:14

Magistratura mato-grossense avança na construção de orientações jurídicas sobre TEA

 Continuar lendo